Minha nova resenha no portal da Gazeta do Povo


Escrevi no blog do Gustavo Nogy, no portal da Gazeta do Povo, sobre "A inteligência e o cadafalso", do Albert Camus, Editora Record:
É uma obra de Camus e isso basta
por Cassionei Niches Petry

Durante boa parte da minha “dolce vita”, por não poder comprar muitos livros, fui usuário de bibliotecas. Primeiro as das escolas onde estudei, passando depois pela pública municipal, as do Sesc e Sesi, até chegar à da universidade. Com o tempo, formando minha própria biblioteca, a que denominei de “toca”, fui me escondendo e evitando ao máximo sair dela.
Nessa construção de um templo particular para os livros, podemos encontrá-los a preços camaradas em sebos e em lojas virtuais. Há alguns títulos esgotados, entretanto, que acabam sendo vendidos por valores proibitivos. Era o caso de A inteligência e o cadafalso, de Albert Camus. Não esperava tão cedo uma nova edição da obra. Porém (ai, porém), como escreveu Chamfort (que merece um capítulo no livro) em uma de suas máximas, “felizes os que nada esperam, nunca serão desiludidos”. Feliz estou por poder enriquecer minhas estantes bambas com uma reedição da obra pela Record. Quero dizer, feliz em parte.
Com novo projeto gráfico e tradução de Manuel da Costa Pinto e Cristina Muracho, a obra é uma reunião de críticas e prefácios de Camus. Se em O mito de Sísifo e O homem rebelde os ensaios são mais filosóficos, aqui a tônica é a literatura mesmo, principalmente sobre autores franceses, alguns deles ilustres desconhecidos para o público brasileiro, como Jean Grenier.
O ensaio que dá título ao volume foi publicado originalmente em 1943 em uma edição temática da revista “Confluences” sobre os “problemas do romance”. Abordando clássicos da literatura francesa, como O vermelho e o negro, de Stendhal, Camus afirma que são obras que se preocupam em “levar suas personagens, imperturbavelmente, ao encontro do que as aguarda”, no caso de Julian Sorel ao cadafalso, à guilhotina, enquanto que a inteligência é o engenho do escritor.
O artigo seguinte analisa a obra de Herman Melville, para Camus um criador de um grande mito sobre a luta do homem versus o mal, o romance Moby Dick, que o coloca num patamar elevado de elaboração artística: “o escritor de talento recria a vida, ao passo que o gênio, além disso, a coroa com mitos”.
Depois de uma “Introdução às Maximes de Chamfort”, passando por artigos sobre Oscar Wilde (cujo “maior esforço era transformar sua própria vida em obra de arte e viver apenas sob a lei da harmonia e do refinamento”) e André Gide (“o modelo de artista, o guardião, o filho de rei, que vigiava as portas de um jardim onde eu queria morar”) e um longo ensaio sobre Roger Martin du Gard, autor do monumental Os Thibault, o volume fecha com duas resenhas sobre obras de Jean-Paul Sartre.

Datados em 1938 e 1939, antes da desavença entre os dois, os textos do jovem Albert Camus refletem sobre dois livros do jovem Sartre: o romance A náusea e os contos reunidos em O muro. Confesso que minha obstinação por esta coletânea era por causa dessas resenhas. Achei-as, no entanto, sem sal, decepcionantes, enfim. Por isso, talvez pela expectativa exagerada, a minha felicidade por ter o livro murchou. Apesar de ser ainda um Camus, a obra fica aquém dos outros títulos consagrados. Mas, repito, ainda assim é um Camus, e vale os “temers” investidos.

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